Segurança do trabalho X pandemia

Especialistas orientam sobre melhores práticas para evitar dores de cabeça no futuro

Clemilton Lima, especialista em SSMA (Segurança, Saúde e Meio Ambiente).

A pandemia trouxe muitas mudanças e aprendizado para todos – sem exceção. Mas no ambiente corporativo algumas práticas ganharam ainda mais rigor. É o caso da segurança do trabalho. Por definição ela é a ciência que promove a proteção dos trabalhadores em seu local de trabalho para proporcionar a prevenção e ou redução de acidentes e doenças ocupacionais.

Mas como fica a segurança dos funcionários em tempos de coronavírus?

Clemilton Lima, Gerente de SSMA (Segurança, Saúde e Meio Ambiente) e membro da Câmara de Prestação de Serviços da Abralimp é assertivo: “Estamos vivendo tempos novos e de grande aprendizado em todos os aspectos, principalmente no âmbito da segurança do trabalho. Por isso as organizações precisam se reinventar e inserir em seus Programas de Segurança as normas e protocolos de prevenção a Covid-19.”, diz.

Segundo ele é preciso que as empresas tenham políticas de prevenção complementares, alinhadas às orientações sanitárias da OMS (Organização Mundial da Saúde), Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.

Especialista com quase vinte anos de experiência na área administrativa e industrial com destaque na Gestão de SSMA em indústrias químicas e petroquímicas, Lima explica que as medidas a serem adotadas pelas empresas devem ser avaliadas e implantadas considerando as atividades e interação com a sociedade.

“É preciso ter em vista que cada setor econômico tem particularidades bem especificas. Sendo assim critérios devem ser definidos considerando a exposição dos colaboradores e a necessidade direta do desenvolvimento das atividades, como por exemplo, em supermercados, transporte coletivo, limpeza e conservação, segurança patrimonial, shoppings centers, empreendimentos de entretenimento e serviços Bancários, entre outros.”

Portaria

Caio Taniguchi Marques, advogado especializado nas áreas tributária e previdenciária.

Em 18 de junho de 2020 foi divulgada a portaria conjunta nº 20, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, órgão de fiscalização e regulação das Normas de Segurança do Trabalho vinculado ao Ministério da Economia sobre controle e mitigação dos riscos de transmissão da Covid-19 nos ambientes de trabalho.

Caio Taniguchi Marques, advogado trabalhista do escritório TSA Advogados orienta: “A segurança no trabalho ganha ainda mais relevância em situações de pandemia. O que já era obrigatório sob a ótica legal passa a se tornar imprescindível para a boa gestão de pessoas e manutenção dos postos de trabalho”, esclarece.

Ainda de acordo com ele, é importante pontuar que o desconhecimento mundial da Covid-19 (sua origem, tempo de contaminação, propagação e período de incubação, entre outros fatores) impossibilita a adoção de medidas totalmente eficazes contra o vírus.

“A propósito, diversos municípios do país têm publicado protocolos relacionados à Covid-19, por isso vale estar atento às normas ali contidas. A construção de uma política interna, adaptando tais procedimentos às rotinas da empresa é uma medida ideal”, destaca.

Em contrapartida, as autoridades governamentais e sanitárias alinhadas à OMS têm exigido adoção de diversas medidas específicas para o combate à doença. Entre elas está a aferição regular da temperatura corporal; obrigatoriedade de uso de máscara de proteção; obrigatoriedade de disponibilização de álcool em gel 70%; desinfecção regular dos ambientes de trabalho; distanciamento entre pessoas ou adoção de barreiras; número máximo de pessoas em cada ambiente; realização periódica de exames; adoção de protocolos de afastamento e acompanhamento em caso de pessoas sintomáticas ou com contaminação confirmada.

O executivo Lima enfatiza que as organizações precisam definir os protocolos e divulgar para seus colaboradores com a indicação das medidas necessárias para prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão do coronavírus, assim como quais protocolos precisam ser adequados à atividade econômica, considerando as formas de contágio e as medidas adequadas de cuidado.

“Destaco aqui a necessidade de formalização dos protocolos de prevenção para todos os colaboradores e terceirizados e de outros trabalhadores que interajam com a organização, mesmo de forma eventual. Esses protocolos precisam ainda ter abrangência aos familiares dos colaboradores e contatos diretos próximos que são fonte de contágio, devendo as orientações estar em conformidade com as orientações das autoridades sanitárias competentes”, orienta Lima.

Medidas de segurança

Marques lembra que para as empresas que estão atravessando a pandemia com os profissionais na linha de frente das atividades – como as do mercado de limpeza profissional – é imprescindível a construção de um protocolo sanitário acompanhado de um rigoroso acompanhamento de seu cumprimento e utilização. “Isso oferecerá bons argumentos jurídicos para utilizar em eventual defesa”, diz.

Vale destacar que apesar do Governo Federal ter autorizado prorrogar a realização de exames médicos obrigatórios, inclusive na contratação de trabalhadores durante a pandemia – conforme artigos 15 a 17 da Medida Provisória nº 927/20 – a recomendação é que seja realizado o exame admissional ou, na sua impossibilidade, uma detalhada pesquisa de saúde do trabalhador (pelo médico do trabalho da empresa ou pela área de Recursos Humanos) antes do início das atividades, minimizando o risco de trazer para o ambiente da empresa um trabalhador contaminado ou com elevado grau de risco de contaminação.

Lima também é assertivo sobre as organizações que continuaram atuando ou aumentaram o volume de atividades durante o período de pico da curva do novo coronavírus.

“Empresas que têm em sua estrutura profissionais de Segurança e Medicina do Trabalho preparados, com perfil alinhado à Gestão de Crises saíram na frente com um planejamento rápido e dinâmico, adaptando-se ao novo cenário de um risco invisível, com alto poder de propagação em seres humanos e um comportamento totalmente desconhecido e imprevisível aos diversos organismos.”

Para o executivo esclarecer de forma técnica e pedagógica as medidas de segurança quanto aos riscos de contágio no ambiente de trabalho ou decorrente da execução dele precisam seguir uma hierarquia lógica composta por medidas de engenharia – mudança estrutural no ambiente de trabalho de modo a introduzir barreiras entre o risco e colaborador. “Como exemplo podemos citar as barreiras físicas para evitar a exposição de colaboradores com pessoas (locais de atendimento ao público), sistemas de ventilação natural provendo maior circulação e troca do ar, (evitando ar condicionado)”.

Medidas administrativas também compõem o escopo de ações: protocolos, treinamentos, DDS (diálogo diário de segurança) e orientações gerais para a execução do trabalho de forma segura. “Isso inclui ainda sinalização horizontal e vertical, controle de acesso, distanciamento social, trabalho remoto, entre outras medidas”, enfatiza Lima.

Já os EPI´s (equipamento de proteção individual), segundo ele precisam ser implantados visando proteger os colaboradores. “É responsabilidade do empregador o fornecimento de material adequado ao risco e exposição, bem como a orientação sobre higiene e conservação”.

Trabalho remoto

Karina Suzana da Silva Alves, advogada especializada na área trabalhista.

Karina Suzana da Silva Alves, advogada especializada na área trabalhista do escritório TSA, enfatiza que essas medidas são aplicáveis aos trabalhadores que exercem suas funções dentro do ambiente da empresa. Para aqueles que passaram a cumprir suas atividades em ambiente remoto (em casa ou outro local) a empresa deve estar atenta aos riscos inerentes à modalidade.

Esse é, inclusive, um ponto que merece bastante atenção por parte das empresas. “Elas devem estar engajadas com o tema, em total sintonia com os departamentos jurídicos e disseminar treinamentos e informações às lideranças sobre as diferenças legais entre alterar o regime de trabalho para teletrabalho – quando a atividade for exercida em definitivo na forma remota – e também sobre a permissão do labor na forma remota (home office), bem como na adoção de modelos híbridos”, orienta a advogada.

“É necessário, portanto, construir uma política de trabalho remoto com identificação dos trabalhadores elegíveis a cada uma das suas modalidades, com clara indicação dos impactos jurídicos e de saúde e segurança aplicáveis a cada uma delas”, ensina.

Nesse contexto as medidas devem considerar não só os riscos de contaminação e propagação da Covid-19, mas também os riscos de acidentes ou doenças do trabalho decorrentes da ausência de ambiente físico e mobiliário adequado para o exercício da atividade.

“É necessário, portanto, formatar uma política de trabalho remoto com identificação dos trabalhadores elegíveis a cada uma das suas modalidades, com clara indicação dos impactos jurídicos e de saúde e segurança aplicáveis a cada uma delas. Inclusive, diversas empresas já têm em prática ajuda para custear ferramentas indispensáveis ao trabalho (cadeira, mesa, luminária, internet) sem gerar o recolhimento dos encargos e tributos”, lista a advogada.

Os especialistas fazem coro ao apontar que as principais questões relacionadas ao trabalho remoto são as horas extras e o risco de ocorrência de doença ou acidente de trabalho diante da ausência de política ou ferramentas adaptadas ao ambiente residencial.

Ações planejadas

“Em nosso entendimento a empresa terá que implementar ferramentas que lhe permitam acompanhar a rotina do trabalho remoto de cada colaborador, sem invadir a sua privacidade. Uma alternativa que nos parece viável é a realização de conversas regulares entre gestor e colaborador e/ou realização de periódicas pesquisas internas, para reiterar as medidas que devem ser observadas no trabalho remoto e colher sugestões de melhoria no trabalho remoto. Recomenda-se que essas conversas sejam formalizadas”, pontuam Karina e Marques.

Lima também enfatiza a importância de ações planejadas para obter melhores resultados com o trabalho remoto. “O segredo do home office em qualquer situação está em um bom planejamento de trabalho, avaliando a viabilidade de implementação prática, com os benefícios diretos e indiretos para ambas as partes e também da coletividade”, diz, para acrescentar: “um plano de trabalho precisa ser acordado com metas, prazos e formas de comunicação deixando claro que o home office é apenas uma mudança de ambiente e todas as responsabilidades trabalhistas e de produtividade estão mantidas integralmente conforme as regras da legislação trabalhista e previdenciária vigentes”.

Os jurístas também alertam: a configuração de doença ou acidente de trabalho independe do local em que ocorre. Se o evento que gerou a incapacidade trabalho decorreu do exercício da atividade, isso basta para o trabalhador ser afastado das suas atividades, ter acesso a benefício concedido pela Previdência Social (na hipótese do afastamento ser superior a 15 dias), garantir a manutenção do recolhimento do FGTS e obter estabilidade por 12 meses após o retorno às atividades. “Daí a importância de elaborar estudo prévio e estruturar uma política adequada ao trabalho remoto”, reforçam.

“Vale destacar ainda que os afastamentos por motivo de doença e acidente do trabalho impactam diretamente no cálculo do Fator Acidentário de Prevenção – FAP, que flexibiliza (para mais ou para menos) a alíquota da contribuição RAT/SAT (que é calculada com base na folha de pagamentos). Portanto, o aumento do número de afastamentos tende a gerar o aumento da contribuição RAT/SAT.”, acrescenta Marques.

Retomada

Mas com a curva de avanço da pandemia estável e diversas regiões do país passando à fase verde do plano de flexibilização, muitas empresas já estão anunciando a retomada presencial das atividades.

O que deve então, ser considerado para que os trabalhadores voltem ao ambiente de trabalho em segurança?

Lima indica que os ambientes devem ser organizados visando manter a higiene adequada em estações de trabalho, áreas comuns (copas, refeitórios, vestiários e banheiros), assim como a manutenção do distanciamento social seguro para evitar aglomerações que propiciem a disseminação do vírus. “É importante também prover os ambientes com recursos adicionais e complementares para a higiene das mãos e etiqueta respiratória”.

A implementação de processo de triagem nas entradas dos locais através da aferição de temperatura corporal é importante para evitar que colaboradores ou pessoas com suspeita da doença acessem o ambiente de trabalho e possam gerar contaminação das equipes.

Além disso, as equipes devem ser orientadas através dos diálogos de segurança, bem como a distribuição de informativos e outros meios de comunicação sobre as formas de contágio da doença, sinais, sintomas e cuidados necessários para a redução da transmissão no ambiente de trabalho e na comunidade devem ser uma das primeiras medidas a serem tomadas.

Do ponto de vista jurídico a orientação para esta fase é que as empresas adotem um canal de comunicação específico para tratar as questões relacionadas á Covid-19. “Acreditamos que a partir de pesquisas internas e do acompanhamento da rotina dos trabalhadores no pós-pandemia a empresa terá elementos suficientes para demonstrar que buscou adotar todas as medidas necessárias para evitar a contaminação e a propagação do vírus”, ensina Karina.

Marques acrescenta: “uma boa medida nesse sentido, que já tem sido adotada por muitas empresas, é a publicação e constante atualização do denominado Plano de Retomada onde há clara indicação de todas as medidas sanitárias adotadas”.

No entanto, os funcionários também devem cumprir fielmente as regras divulgadas pelas empresas, além de reportar casos de contaminação de pessoas em seu convívio mais próximo. “O descumprimento das medidas sanitárias expressamente divulgadas pode ser considerado como ato faltoso (conforme art. 158, § único da CLT).”, enfatiza Karina.

O que fica de aprendizado?

 O que sabemos atualmente é como nos proteger e como proteger as pessoas que estão em nosso convívio. Portanto, a frase muito usada desde sempre precisa prevalecer nesse momento: a prevenção é o melhor remédio”, diz Lima.

Para o especialista tanto empresas como colaboradores precisam aprender a conviver com essa nova realidade, o chamado “novo”. “O novo formato de se relacionar, de vender os seus serviços, de executar as suas atividades, o lazer em família, o estudo e todas as formas anteriormente chamadas de “normais” não vai mais existir, precisamos nos adaptar a essa nova realidade. Precisamos nos reinventar e saber que lidar com as pessoas e processos requer habilidades que podemos ter, assim como perseverança e resiliência”, finaliza.

Fonte: Associação Brasileira do Mercado de Limpeza Profissional – ABRALIMP.

Foto/Divulgação: ABRALIMP.